Quarta-feira, 29 de Junho de 2005
Arqueologia do bolo de arroz - os primórdios
O maná era parecido com a semente de coentro e tinha a aparência do bdélio. O povo espalhava-se para recolhê-lo; e o moÃa em moinho ou o pisava num pilão; cozia-o em panelas e fazia bolos. O seu sabor era de bolo amassado com azeite. Quando, à noite, o orvalho caÃa sobre o acampamento, caÃa também o maná.
Números, 11, 7-9
Claro que não me pagam para isto
O umbigo do mundo está cheio de cotão.
Segunda-feira, 27 de Junho de 2005
A resposta pode ser outra coisa
Quando perguntavam uma coisa a Tonino Guerra, na sessão do cinema King que teve lugar este Sábado, ele respondia quase sempre com uma história. Talvez isto seja um truque que se aprende com a velhice, não sei. A verdade é que as histórias são, regra geral, bem mais interessantes que as respostas. Isto é uma coisa muito séria.
Andei à procura de uma imagem do segundo filme animado da sessão - O Leão da Barba Branca - mas não consegui. Uma dúvida: nos press releases e notÃcias que li fala-se deste filme como sendo realizado por Andrej Krjanovsky, tal como Il lungo viaggio, mas percebi na sessão que o filme fora feito por um Sergei qualquer coisa - não consegui apanhar o segundo nome. E não encontro sÃtio que me esclareça esta dúvida.
A verdade é que talvez seja melhor não encontrar imagens. Se eu voltasse a olhar para a cara daquele leão, desfazia-me provavelmente em lágrimas. E nem sequer tenho, como o domador, um casaco para deixar-lhe sobre os ombros.
Domingo, 26 de Junho de 2005
Hoje ouvi mesmo uma pessoa rir-se assim
Ah-cacacacacacacacacacacacacacacacacacacacacacacah-cacacacacacacacacacacacaca
cacacacah-ahcacacacacacacacacacacacacacacaca
Depois já estava demasiado longe, não sei como acabou.
Quinta-feira, 23 de Junho de 2005
Tempos livres
Conheci um homem que tinha como passatempo ficar sentado no cais das estações de Metro a ver as mulheres que vinham a correr para apanhá-lo (ao Metro, não a ele).
O que é que eles andam a querer esconder?
A verdade é esta: ontem foi o dia mais longo do ano, o primeiro dia de Verão, e ninguém diz nada. Andam a querer enganar o povo, andam a esconder coisas, é o que vos digo.
Em Lisboa estava uma temperatura de sopa, o ar pesado e a mover-se devagar, e eu gostei. O céu estava encoberto, e eu gostei na mesma. É uma angústia clássica e quase caseirinha, mas o facto é que a partir de agora os dias começam a ficar mais pequenos. Percebem? Foi ontem.
(bom, na verdade foi anteontem, pelo calendário, mas passam uns minutos da meia-noite e ainda não me deitei)
Quarta-feira, 22 de Junho de 2005
Por favor
Deixem em paz os objectos pousados sobre a mesa.
Ainda os objectos de passar para o outro mundo (alguns posts atrás)
Um bule. Porque não um bule? Uma história com um bule, e o bule permitia contactar o outro mundo. Pensem nisso.
Quem se lembra destes desenhos?
Era uma espécie de régua de plástico transparente. Trazia umas rodelas, também de plástico, de formas e tamanhos diferentes. Colocavam-se sobre o papel, e colocava-se a ponta do lápis no buraco central das rodelas. Girava-se o lápis sobre o papel, com mais ou menos força, amparando a amplitude do movimento nos limites da régua, e consoante o tamanho e formato da rodela formavam-se desenhos concêntricos, em forma de flores, estrelas, alguns semelhantes a estruturas atómicas.
De repente lembrei-me disto e senti que tinha de voltar a ter uma coisa destas. Fui à Papelaria Fernandes. O empregado primeiro disse com ar conhecedor que se tratava de um pantógrafo, mas depois franziu a testa: ‘Não, espere... já sei, já sei do que fala. Lembro-me disso, mas nunca mais vi, desde que era pequeno.’ E sorriu com ar cúmplice.
Da próxima vez que for Ã
escola abandonada, já sei o que vou procurar.
Terça-feira, 21 de Junho de 2005
O vento, a criança dos céus
Há dias vi, num concerto, um violinista a braços com uma rajada de vento súbita que entrou pela janela e lhe passou à frente duas ou três folha da pauta. Na assistência, que estava muito próxima dos músicos, uma senhora tentava ajudar, repondo no sÃtio as páginas rebeldes com a ponta do leque, cheia de medo de que este fosse trucidado pelo movimento do violino. O violinista, esse, ria-se e continuava a tocar.
Lembrei-me então de um dos melhores episódios de concertos a que assisti - no Estoril Jaz, há uns anos. Ia tocar a orquestra de Count Basie; a noite era quente e ventosa e o palco ficava numa espécie de coreto. Quando os músicos subiram, ergueu-se de súbito um vento em redemoinho que levantou no ar uma nuvem de folhas de pauta, enquanto eles olhavam, incrédulos, vendo-as cair de seguida, rodando em desordem, sobre o palco. Depois, começaram a rir, apanharam-nas do chão, trocaram-nas entre si, espreitaram para cima com ar de censura, a ver se não se repetia a brincadeira, e começaram.