Sexta-feira, 29 de Outubro de 2004
Pinto da Costa no sapatinho
align=left vspace=4 hspace=4>Este ano escolher as prendas de Natal será muito mais fácil: a 26 de Novembro sai a
autobiografia (designada como 'a obra', no site oficial do FCP) de Pinto da Costa. Faça como eu (vide foto) - reserve já o seu exemplar!
Fomato 16,75x24 cm, 25 euros.
Quinta-feira, 28 de Outubro de 2004
Vêem como é verdade?
Revelações profundas no
cartoon do DN de hoje.
Quarta-feira, 27 de Outubro de 2004
As palavras da língua alemã mais bonitas - a explicação
Apenas a explicação para duas das vencedoras, citando os seus proponentes.
Rhabarbermarmelade
Creio que muitos não compreenderam este concurso. Não se trata de escolher as coisas mais bonitas, mas a palavra mais bonita. 'Kinderlachen' [riso de criança] é uma coisa maravilhosa. Mas que palavra agreste! Imagine-se alguém que não fala alemão. E que lhe dizemos, em voz um pouco alta, 'Kinderlachen'.
Com o susto, vai pôr-se a milhas! Também Liebe [amor], Glük [felicidade] e Heimat [pátria] são coisas excelentes. Mas as palavras correspondentes não são nada sugestivas e não são, de todo, mais bonitas que Hiebe [pancadas], Mücke [mosquito] ou Fahrrad [bicicleta]. Actualmente, a minha palavra preferida é 'Rhabarbermarmelade'. Que sonoridade!
E que sensação de bem-estar me envolve quando, ao Domingo de manhã, digo assim à minha querida: 'Barbara, passas-me por favor a 'Rhabarbermarmelade?'
O dia está ganho!
Frank Niedermeyer Alemanha
Libelle (vencedora do prémio de palavra mais bonita escolhida por crianças)
A palavra alemã que acho mais bonita é 'Libelle' [libélula], porque gosto de palavras com a letra 'l' e esta tem logo três. É que é uma palavra tão fácil de procunciar. Desliza tão bem sobre a língua.
Mas também acho bonito o esvoaçar das libélulas e isso é uma coisa que se vê na palavra. A palavra faz com que, logo desde o início, se goste do animal e não se tenha medo dele. Se a palavra fosse qualquer coisa como 'Wutzelkrump', não seria nada assim. Gostava de saber quem inventou esta palavra. De certeza que era uma pessoa agradável. Porque é a palavra mais agradável que conheço.
Sylwan Wiese, 9 anos Alemanha
Le poète qui rit
O poeta não veio em pequenos triângulos dentro de uma caixa circular, mas lá que se ria, ria. O poeta, Manuel da Silva Ramos, estava acompanhado de um
partenaire, Changuito, e ambos foram, ontem à noite, anfitriões de uma sessão de leitura de poemas e excertos de prosa no
Bar A Barraca. A grande surpresa foi ver, ao chegar, a casa cheia (da última e única vez que fui a uma sessão destas havia sete - 7 - pessoas, reduzidas para três ou quatro no momento em que teve início a sessão). Senti que o mundo voltava ao normal quando, ao dar início ao grande espectáculo, foi pedido às pessoas que mantivessem silêncio. Ficar em silêncio, essa arte fora de moda, desmotivou alguns frequentadores destas paragens, que saíram discretamente, e estavam no seu pleno direito. Confesso que tinha ido para ver apenas um bocadinho (a hora era imprópria para trabalhadores assalariados), mas acabei por ficar até ao fim. O artista era um bom artista. Changuito saíu-se lindamente na sua função de
diseur, ou, de forma mais circense, de Marlene assistente do ilusionista Manuel da Silva Ramos Os poemas e prosas convenceram, e muito, e o poeta, entre hesitações e falhas de leitura, ria-se de vez em quando, ao deparar-se com um palavrão ou com uma descrição mais humorística ou embaraçosa para Pessoas de Bem. É sabido que as mulheres honradas (como eu) não têm ouvidos, mas que fazer perante um poeta que ri?
Voltei para casa no meio de um vento desgovernado, impregnado de chuva,
equipada para morrer, como disse o MdSR num poema inédito que leu (e, tal como no poema, não morri). Lembrei-me depois de que não verifiquei se já têm ou não Macieira no bar.
Pelo que entendi, Manuel da Silva Ramos tem alguns dos seus onze livros publicados pela Fenda. Uma breve síntese do percurso bibliográfico
aqui.
Segunda-feira, 25 de Outubro de 2004
Ainda o doce de ruibarbo
align=left>A versão mais frequente desta especialidade é na combinação morango e ruibarbo. Obtém-se uma compota rosada, espessa, mas não muito compacta, com um travo ácido forte, excelente para quem gosta de temperar as coisas muito doces com um sabor contrastante. O ruibarbo, para quem não conhece, tem este aspecto:
Aproveitam-se os caules vermelhos, que se cortam em pedaços, depois de retiradas as partes mais fibrosas. Para além da compota, pode ser usado em bolos de queijo (daqueles de ir ao forno, não nos insípidos cheescakes que os restaurantes portugueses costumam ter) e outros doces. Não conheço nenhuma utilização em pratos salgados, mas talvez haja.
Pela Verdade!
Talvez por pudor, a
Alexandra não contou que atirámos gaivotas e pavões para cima das mesas das pessoas que comiam no jardim do palácio de Cristal, de maneira a aterrarem em cheio em cima dos pratos. E que roubámos e furámos a bola dos miúdos que jogavam em frente à Cadeia da Relação, e enfiámos sorrateiramente as cascas das castanhas assadas dentro da carteira das senhoras que subiam a rua de Santa Catarina. Porque, é preciso dizer a verdade, são essas coisas que os bloggers fazem quando se encontram.
As mais belas palavras alemãs
O Goethe Institut e o Deutsche Sprachrat associaram-se com o objectivo de chamar a atenção para a riqueza e beleza da língua alemã (sim, também existe). Qualquer falante de língua alemã podia enviar a sua proposta de palavra mais bonita, e um júri fez depois a escolha final (
ver aqui). Os resultados estão
aqui.
A palavra vencedora foi 'Habseligkeiten', enquanto a fabulosa 'Rhabarbermarmelade' ficou em quinto lugar. Os participantes tinham de enviar um breve comentário justificando a sua escolha. Ainda hoje tentarei traduzir para aqui algumas das justificações, porque valem a pena.
Adianto, entretanto, que 'Rhabarbermarmelade' quer dizer doce (ou compota) de ruibarbo. A palavra enche completamente a boca do ruído de vogais sólidas e alegres que se chocam por entre os dentes. Quanto ao doce de ruibarbo, propriamente, é delicioso, e há anos que anseio que essa planta de caules ácidos e vermelhos apareça por cá. Hei-de procurar a receita do doce, ainda assim.
Sexta-feira, 22 de Outubro de 2004
Perfil biográfico: o senhor da música do Metro
Há anos que anseio por conhecer o senhor (de fonte segura, sei que é um homem) que escolhe a música que se ouve nas estações de Metro. Como cliente habitual, tenho já bastante experiência na audição deste tipo de música. Tenho-me apercebido da evolução de tendências: a passagem notória do domínio dos grandes êxitos pop em versão para orquestra sinfónica para, mais recentemente, os grandes 'ites' do rock e pop dos anos 80, o que me faz suspeitar de que a difícil tarefa mudou de mãos. Não tendo possibilidade de conhecer, senão por intermédio da música, a pessoa em questão, achei que conseguia, a partir da análise da banda sonora, definir um perfil biográfico.
1971 - Nasce em Loures, o mais novo de dois irmãos. A infância decorre na normalidade.
1982 - No segundo ano do ciclo preparatório (assim se chamava na altura) tem uma paixão fulminante pela amiga de uma colega de turma. Da primeira vez que a viu, estavam numa festa de anos, a dançar um slow ao som de I like Chopin.
1984 - Começa a ficar com buço. Meses mais tarde, depois de hesitar entre assumir ou não assumir que já tem bigode e que deve rapá-lo, dá o grande passo, roubando uma gilette à irmã mais velha. Na rádio estava a dar Tarzan Boy, e sentiu que era finalmente um homem.
1985 - Conhece aquela que viria a ser a sua primeira namorada. Dão o primeiro beijo numa excursão de autocarro, enquanto ouvem, na RFM, então uma estação recente, Bonnie Tyler, com I need a hero.
1992 - Primeiros sintomas de nostalgia da música dos anos 80. Começa a frequentar bares onde se ouve Power Station e Alphaville.
1993 - Entra ao serviço do Metro. Um dia, ao pé da máquina do café, ouve pela primeira vez falar na ideia de colocar música de fundo nas estações. Nessa noite, não dorme, a pensar no assunto.
2000 - Após vários anos na área logística, e devido à sua boa disposição contagiante, é chamado a colaborar numa task force cujo objectivo é recolher e pôr em prática ideias de melhoria do bem-estar dos passageiros. Ao recolher os impressos enviados anonimamente pelos colaboradores da empresa, acrescenta algumas dezenas de sugestões, com letra disfarçada, chamando a atenção para a necessidade de repensar a estratégia musical do Metro. Termina o 14º volume da sua compilação Música para Todos, Música Também para Ti, um trabalho que lhe ocupa os serões desde há alguns meses.
2001 - É nomeado assessor do responsável pelo Gabinete de Gestão de Espaços de Acesso e Embarque da rede do Metro de Lisboa. Casa-se com uma colega de trabalho - das raparigas que conheceu, é a única que sabe de cor a letra de You take me up, dos Scotch, o que o deixou comovido desde o primeiro momento. Na verdade, é a única pessoa dos seus conhecimentos que se lembra dos Scotch.
2003 - Não consegue a promoção, mas, em compensação, são-lhe dados amplos poderes para seleccionar a música para as estações de Metro. E lá continua.
Quarta-feira, 20 de Outubro de 2004
O Artur faz hoje anos
Arthur Rimbaud nasceu
há 150 anos.
Terça-feira, 19 de Outubro de 2004
Serões literários
Estavam, como sempre, as duas sentadas à esquina, à espera de que eu passasse na direcção do sofá. É um percurso que geralmente fazem em quatro, cinco passos em trote alegre, mais um salto ligeiro em direcção ao paraíso. Desta vez, mal me viram aparecer de livro na mão voaram para as costas do sofá e esperaram que eu me fosse sentar e assumisse a posição de dois lugares de colo.
- Vais ler-nos mais daquele livro, não vais?
Pus-lhes o livro à frente do nariz; esfregaram o pescoço na lombada, a Zazá deu uma dentada de satisfação num dos cantos, meteu a segunda velocidade no ronronar e deitou-se numa posição que andava a estudar há semanas, com a cabeça apoiada na parte mais confortável da minha barriga, o pescoço estendido na minha direcção e os olhos quase fechados.
- Lê aquela parte em que ele descreve a gata
- Já li isso umas cinco vezes.
- Ah, mas é tão bonito, como ele fala dela...
- É, mas gostava de ler o resto da história.
A Zazá cravou uma das unhas da pata direita na minha coxa.
- Como é que era?
- Sabes perfeitamente como era. Tartaruga, como tu.
- E ele diz que nunca tinha visto uma gata tão linda, não é?
- Vês, como te lembras? Vou continuar a ler onde estava.
When he heard people with no knowledge of a cat's character saying that cats were not as loving as dogs, that they were cold and selfish, he always thought to himself how impossible it was to understand the charm and lovableness of a cat if one had not, like him, spent many years living alone with one.
A Zazá espetou a segunda unha, abriu ligeiramente um dos olhos na minha direcção, ronronou mais alto.
- Ele deixa a gata dormir na cama dele, não é...?
- É.
Suspirou, fixou-me com as pupilas escuras e abertas, dilatadas pela luz do candeeiro, e recolheu a unha.
The reason was that all cats are to some extent shy creatures: they don't show affection or seek it from their owners in front of a third person but tend rather to be oddly standoffish. Lily too would ignore Shozo or run off when he called her, if his mother were present. But when the two of them were alone, she would climb up on his lap without being called and devote the most flattering attention to him. She often put her forehead against Shozo's face and then pushed as hard as she could; at the same time, with the tip of her rough little tongue she licked away at him - cheeks, chin, the tip of his nose...
Aqui começaram ambas a repuxar-me o tecido das calças com as patas, como se amassassem pão. Afastei-lhes as patas delicadamente, explicando que aquilo doía, e que aquilo estragava a roupa. A Zé deitou-se com a barriga às bolinhas virada para mim e esticou a cabeça para trás. Cumpri o meu dever.
- Carapaus marinados, isso será bom? - interrogou-me de repente a Zazá.
- Não creio - disse eu.
Fechou os olhos outra vez, bocejou mostrando os caninos e o céu da boca às manchas.
- Ele deixa-a dormir na cama...
(com o patrocínio de Jun'ichiro Tanizaki, em A cat, a man and two women, edição em inglês da Kodansha, trad. Paul McCarthy)