Quarta-feira, 15 de Setembro de 2004
Com o patrocínio de Quitoso
Descobrimos não só que temos piolhos e baratas no Epicentro, mas que ainda por cima estes andam a fazer campanha política pelo candidato Bush e, nos intervalos, a roer os cantos das letras das mensagens deste blog, provocando alterações semânticas não negligenciáveis. Por motivos de higiene e para evitar contágios, encerramos para um período de desifestação até ao final do mês.
Terça-feira, 14 de Setembro de 2004
Era uma casa muito engraçada
Três paredes. Não tinha nada.
Tudo seria mais fácil se pudesse habitar os espaços vagos entre um canto e outro, entre partir e chegar, entre ser eu e algo de vagamente semelhante a isso; habitar entre as pregas do pano que abre o palco, e dizer (sem microfone, a voz vibrando, real, na madeira dos camarotes): 'Mas que bem se está no campo!'
A cilada é esta: ser nómada do próprio corpo, nómada do estado de não habitar onde caibam o corpo e as suas palavras. Dou-vos a minha perna esquerda, mas em breve irei pedir que ma devolvam.
Mãos que aconcheguem os lençóis, a chama inteira no momento de se apagar, um voo de ave que começa antes e termina depois do horizonte que se avista da janela. Pode ser que haja música lá fora.
ou
Pássaros voando debaixo dos lençóis em chamas. E no entanto os pés estão frios. A porta ficou aberta.
Quem levou as minhas mãos que a feche.
É um piano.
Segunda-feira, 13 de Setembro de 2004
Oficina de tradução literária na Ler Devagar
Começa em finais de Setembro e é uma iniciativa da revista Ficções e do IPLB. Esta e outras oficinas
aqui.
Sexta-feira, 10 de Setembro de 2004
The Vandermark Five
border=0 align=left> Elements of Style, Exercises in SurpriseNão sei o que diriam
as pessoas simples - por mim, pode ser música para ir fazendo o jantar. Mas também pode ser o jantar que é feito apenas para se ouvir a música. Os meios e os fins, na culinária e na música, são um universo de hipóteses inquietante. Este álbum dos V5 vai acompanhar um tinto da Amareleja, isso é certo.
Quinta-feira, 9 de Setembro de 2004
os objectos que amamos
Sobre eles acumula-se o pó, como sobre a pele certas recordações de beijos e do calor real dos corpos.
Porque os 'éles' em italiano soam muito melhor: Verrà la morte e avrà i tuoi ochi
Verrà la morte e avrà i tuoi ochi.
questa morte che ci accompagna
dal matino alla sera, insonne,
sorda, come un vecchio rimorso
o un vizio assurdo. I tuoi occhi
saranno una vana parola,
un grido taciuto, un silenzio.
Così li vedi ogni matina
quando su te sola ti pieghi
nello specchio. O cara speranza,
quel giorno sapremo anche noi
che sei la vita e sei il nulla.
Per tutti la morte ha uno sguardo.
Verrà la morte e avrà i tuoi ochi.
Sarà come smettere un vizio,
come vedere nello specchio
riemergere un viso morto,
come ascoltare un labbro chiuso.
Scenderemo nel gorgo muti.
Cesare Pavese(esta página tem uma tradução de Jorge de Sena - página Terràvista, até quando?)
Creio que ando a ser seguida
Terça-feira, 7 de Setembro de 2004
Desculpe, não percebi a sua questão
Segunda-feira, 6 de Setembro de 2004
Menina oferece-se
Menina asseada e de boa índole procura colocação em
belgais, com serventia de piscina. Faz serviço de cozinha para a
Cátia, trabalhos na horta, tira as carraças aos cães, apanha a azeitona do pátio das oliveiras, as laranjas do pátio das laranjeiras e deixa-se ficar muito quieta no pátio das palmeiras, à espera de que as folhas das árvores respirem (inspirem, expirem). À espera de poder pousar os pés sobre chão negro e de ver o céu em profundidade, como quem sobrevoa uma floresta. À espera de ter tempo para estar simplesmente à espera de alguma coisa que há-de crescer do meio do silêncio. Entre pátios, com água.
cesare Pavese
Trabalhar Cansa
(Cesare Pavese)
Atravessar uma rua para fugir de casa
só um rapaz o faz, mas este homem que vagueia
todo o dia pelas ruas já não é um rapaz
e não foge de casa.
...................................... Há no Verão
tardes em que até as praças ficam vazias, estendidas
ao sol que vai pôr-se, e este homem que chega
por uma avenida de árvores inúteis pára.
Vale a pena ser-se só, para se estar cada vez mais sozinho?
Percorrê-las apenas - as praças e as ruas
estão vazias. Havia que parar uma mulher
e falar-lhe e convencê-la a viverem juntos.
Doutro modo fala-se sozinho. É por isso que às vezes
vem abordar-nos o bêbado nocturno
e conta os projectos de toda a vida.
Não é certamente ficando à espera na praça deserta
que se encontra alguém, mas quem anda pelas ruas
de vez em quando pára. Se fossem dois,
mesmo a andar pelas ruas, a casa seria
onde está essa mulher e valeria a pena.
De noite a praça volta a ficar deserta
e este homem que passa não vê as casas
entre as luzes inúteis, já não levanta os olhos:
sente apenas o empedrado, que outros homens fizeram
com mãos calejadas, como são as suas.
Não é justo ficar na praça deserta.
Anda certamente na rua aquela mulher
que, rogada, havia de querer dar uma mão à casa.